Resenha de “O Fio da Faca”, de Marcel Novaes
Em ‘O Fio da Faca’, Marcel Novaes apresenta uma narrativa instigante e repleta de camadas que explora as nuances do passado, a complexidade das relações humanas e os dilemas éticos que permeiam o jornalismo.
Ambientado no interior do estado de São Paulo, o livro acompanha a trajetória de Rebeca, uma jornalista que, após vinte anos, retorna à sua cidade natal para investigar um caso de violência sexual que dividiu a comunidade local.
A trama é impulsionada por um conflito social e racial: uma jovem branca acusa um rapaz negro de agressão sexual. Rebeca, enviada por seu editor em busca de uma reportagem sensacionalista, encontra um cenário carregado de preconceitos, emoções exaltadas e interpretações conflitantes.
Por meio das entrevistas que conduz, a protagonista se depara com os diferentes lados da história, questionando os limites éticos do jornalismo e sua capacidade de transmitir a verdade em meio ao ruído e às tensões sociais.
Além do caso que deve investigar, o retorno de Rebeca à sua cidade natal a força a enfrentar os fantasmas de seu passado. Ela reencontra amigas de infância e, de maneira especialmente marcante, sua mãe e sua irmã, relações que permaneciam interrompidas desde que deixou a cidade.
Esses encontros, embora inicialmente desconfortáveis, servem como catalisadores de um processo interno de reflexão e autodescoberta.
Rebeca passa a revisitar sua própria história, especialmente a memória de seu pai, cuja imagem idealizada é progressivamente desconstruída à medida que segredos de família vêm à tona.
O autor constrói a narrativa de forma a tecer paralelos entre o caso jornalístico e os dilemas pessoais de Rebeca.
O confronto com as contradições e injustiças presentes no caso da violência sexual ecoa no percurso interno da protagonista, que também precisa lidar com mágoas e revelações que desafiam sua visão de mundo e de si mesma.
Essa simetria entre a esfera pública e a privada é um dos aspectos mais brilhantes do livro, pois confere profundidade psicológica e emocional à trama, ao mesmo tempo em que levanta questões de grande relevância social.
Outro ponto forte da obra é a forma como Novaes retrata a cidade do interior paulista. As descrições minuciosas do ambiente, das pessoas e das dinâmicas sociais criam um cenário vívido e palpável, que é essencial para o desenrolar da história.
A cidade, com seus contrastes entre tradição e modernidade, funciona como um microcosmo do Brasil contemporâneo, expondo as tensões raciais, sociais e econômicas que atravessam o país.A escrita de Novaes é envolvente, equilibrando fluidez e densidade.
Ele sabe criar diálogos autênticos e cenas que prendem a atenção do leitor, enquanto aborda temas sensíveis com respeito e profundidade. A narrativa não fornece respostas fáceis, mas convida o leitor a refletir sobre questões como preconceito, empatia e redenção.
Em termos de desenvolvimento de personagem, Rebeca é uma protagonista rica e multifacetada. Sua jornada é cativante justamente por não ser linear: ela é obrigada a confrontar as as verdades dos outros e as mentiras que contou a si mesma.
A transformação de sua perspectiva, tanto em relação ao caso que investiga quanto à sua própria história, é conduzida de forma gradual e convincente.
No geral, ‘O Fio da Faca’ é uma obra que transcende a investigação de um crime para explorar temas mais amplos.
Marcel Novaes entrega uma história instigante e emocionalmente impactante, que desafia preconceitos e convida o leitor a enxergar além das aparências.
É um livro que combina elementos de suspense, drama e crítica social de forma magistral, deixando marcas profundas em quem se dispõe a percorrer suas páginas.
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