Resenha | Um caminho particular do futuro – Ricardo Bernhard

“Um Caminho Particular do Futuro”, escrito por Ricardo Bernhard, é um romance introspectivo que mergulha profundamente na psique de uma mãe em luto, enquanto ela busca compreender o que levou seu filho Cláudio a se afastar de tudo e todos antes de sua morte. Ambientado no vilarejo de Sebastião de Ararampava, na região serrana do Rio de Janeiro, o livro é uma exploração dos mistérios da mente humana, das relações familiares e das complexidades do luto. Bernhard constrói um cenário envolvente, onde a tranquilidade aparente da vida rural esconde um turbilhão de emoções e segredos.

O estilo de Bernhard é, sem dúvida, um dos pontos altos do livro. A prosa é transparente e fluida, carregada de uma sensibilidade que consegue transformar o cotidiano em algo sublime e, por vezes, perturbador. As descrições do ambiente e, sobretudo, das memórias de Francine, são feitas com uma precisão quase cirúrgica, proporcionando ao leitor uma imersão total na atmosfera melancólica da obra. Essa clareza, no entanto, não sacrifica a profundidade; ao contrário, ela permite que a complexidade das emoções se desdobre de forma sutil, quase imperceptível, mas sempre presente.

Bernhard tem um talento evidente para capturar a essência dos momentos e das pessoas, explorando as nuances dos personagens com uma habilidade que se revela nas pequenas observações e nos diálogos entrecortados. A escrita é límpida, sem excessos, mas ao mesmo tempo rica em significado. Cada palavra parece ter sido cuidadosamente escolhida para construir uma narrativa que é ao mesmo tempo delicada e densa.

O romance aborda temas como o luto, a incompreensão, e as dinâmicas familiares. Francine, a protagonista, tenta reconstruir mentalmente a imagem do filho Cláudio, que se transformou em um estranho para ela nos anos que antecederam sua morte. Essa tentativa de compreensão é dolorosa e frustrante, pois o “NÃO” encontrado por Francine, escrito pelo próprio Cláudio, parece encapsular a recusa do filho em ser compreendido.

Esse “NÃO” é um símbolo poderoso que permeia a obra, representando não a recusa literal e a rejeição mais ampla de Cláudio a tudo que sua mãe acreditava entender sobre ele. Nessa perspectiva, o livro se desenrola como uma busca incessante por respostas.

O vilarejo de Ararampava também desempenha um papel importante na narrativa, quase como um personagem próprio. É um lugar onde o tempo parece suspenso, onde as memórias e os segredos do passado se entrelaçam com o presente, sendo muito eficaz em criar uma atmosfera claustrofóbica e introspectiva.

No entanto, um dos principais desafios de “Um Caminho Particular do Futuro” é justamente essa atmosfera densa e, por vezes, opressiva que Bernhard constrói. Embora seja inegavelmente eficaz em transmitir a angústia de Francine, essa abordagem pode acabar afastando alguns leitores que preferem um ritmo mais dinâmico ou uma trama com eventos mais palpáveis.

A narrativa é lenta e contemplativa em alguns momentos, o que pode ser cansativo para quem não estiver preparado para uma leitura mais focada nas nuances psicológicas com profundidade literária.

Além disso, a construção dos personagens, embora detalhada e minuciosa, pode parecer excessivamente centrada em Francine, deixando os demais personagens – incluindo o próprio Cláudio – em segundo plano. Essa escolha narrativa faz sentido dentro da proposta do livro, que é, afinal, uma exploração da percepção subjetiva de Francine, mas pode deixar alguns leitores com a sensação de que falta uma visão mais equilibrada da história.

No geral, “Um Caminho Particular do Futuro” é um romance que se destaca pela escrita refinada e pela profundidade com que aborda temas complexos. É uma leitura que exige paciência e disposição para mergulhar nas águas turvas da mente humana, sem garantias de encontrar respostas claras. Para aqueles que apreciam uma narrativa introspectiva e uma prosa bem elaborada, o livro de Ricardo Bernhard é uma excelente escolha.

Porém, essa mesma densidade e o ritmo lento podem ser desafiadores, especialmente para leitores que preferem uma trama mais linear ou que buscam uma resolução mais satisfatória para os mistérios apresentados. A obra pode ser vista como uma reflexão sobre a incompreensibilidade da vida e das pessoas, mas, ao fazer isso, corre o risco de se tornar inacessível para alguns.

Em última análise, “Um Caminho Particular do Futuro” é uma obra que vale a pena ser lida, mas que demanda do leitor uma disposição para aceitar a densidade e a falta de respostas fáceis. É um livro que convida à reflexão com temas sensíveis que com certeza emocionam qualquer leitor.

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Jornalista formado pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Mestrando em Comunicação pelo PPGCOM da UFPE. Amante da cultura pop, apaixonado por livros e adora escrever sobre temas diversos. Além disso, é um entusiasta de música, filmes e séries, sempre buscando explorar e compartilhar suas impressões sobre o mundo do entretenimento.

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